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quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Novas aves da Amazônia


Quinze espécies são descritas simultaneamente, na maior descoberta da ornitologia brasileira em 140 anos

Nova espécie de gralha do gênero Cyanocorax, já ameaçada de extinção: 
encontrada apenas na borda de campinas naturais do sul do Amazonas

Desde a segunda metade do século XIX a ornitologia brasileira não dava uma contribuição tão significativa para ampliar o conhecimento sobre a biodiversidade: 15 novas espécies de aves da Amazônia nacional serão formalmente descritas pela primeira vez numa série de artigos científicos previstos para serem publicados em julho num volume especial do Handbook of the birds of the world, da espanhola Lynx Edicions. Esse tomo fecha uma coleção de 17 livros que, por seu caráter enciclopédico e didático, é adotada como fonte de consulta por ornitólogos profissionais e amadores.

Os autores das descrições pertencem a três instituições nacionais de pesquisa – Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (MZ-USP), Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), de Manaus, e Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), de Belém – e ao Museu de Ciência Natural da Universidade Estadual da Louisiania (LSUMNS), Estados Unidos. Os ornitólogos não apresentavam ao mundo, de uma só vez, numa única obra, um conjunto tão numeroso de novas aves brasileiras desde 1871, quando saiu o livro Zur Ornithologie Brasiliens. Nessa obra, escrita pelo austríaco August von Pelzeln (1825-1891), foram divulgadas 40 espécies de aves coletadas pelo naturalista Johann Natterer (1787-1843), também austríaco, em suas viagens pela Amazônia brasileira.

Onze das novas espécies são endêmicas do Brasil e quatro podem ser encontradas também no Peru e na Bolívia. Oito ocorrem somente a oeste do rio Madeira, na parte ocidental da Amazônia; cinco habitam exclusivamente terras situadas entre esse curso d’água e o rio Tapajós, no centro da região Norte; e duas vivem apenas a leste do Tapajós, no Pará, na porção mais oriental da floresta tropical. No volume especial do Handbook, os autores descrevem a morfologia (formas e estruturas), a genética e a vocalização (canto e sons) das novas espécies. Por meio de mapas específicos para cada espécie, mostram ainda seus locais de ocorrência. No entanto, até que o livro seja oficialmente publicado, o nome científico e alguns detalhes sobre a anatomia e o modo de vida das novas espécies não podem ser divulgados.

Dessas aves até agora desconhecidas e sem registro na literatura científica, a maior e mais espetacular é uma espécie de gralha, do gênero Cyanocorax, com cerca de 35 centímetros de comprimento, que vive apenas na beira de campinas naturais situadas em meio à floresta existente entre os rios Madeira e Purus, no Amazonas. “Essa gralha está ameaçada de extinção”, diz Mario Cohn-Haft, curador da seção de ornitologia do Inpa, principal descobridor do cancão-da-campina, nome popular cunhado para a ave. “Seu hábitat está em perigo e podemos perder a espécie antes de ter tido tempo de estudá-la a fundo.” Sua principal região de ocorrência é um complexo de campinas, distante 150 quilômetros ao sul de Manaus, numa área próxima à rodovia BR-319, que liga a capital amazonense a Porto Velho. A estrada está sendo reformada e os pesquisadores temem que o acesso facilitado ao local coloque em risco o hábitat da espécie. “A nova gralha também ocorre numa zona de campos naturais no sul do Amazonas, próximo a Porto Velho, onde há muitos colonos do Sul do país, que a confundem com a gralha-azul [um dos símbolos do Paraná]”, diz Cohn-Haft.

Poiaeiro-de-chicomendes, nome popular de espécie a ser descrita da família Tyrannidae

Com exceção de uma ave da ordem dos Piciformes, que inclui tucanos e pica-paus, as demais espécies amazônicas agora apresentadas à comunidade científica pertencem à ordem dos Passeriformes. Popularmente chamados de passarinhos, os membros desse grupo representam aproximadamente 55% das espécies de aves conhecidas, como os pardais, canários, bem-te-vis e tantas outras. Além da gralha e do parente distante dos tucanos, serão descritos no livro cinco espécies da família Thamnophilidae (na qual se incluem os papa-formigas), quatro da família Dendrocolaptidae (todas novas formas de arapaçus), três da vasta família Tyrannidae (que compreende 400 espécies presentes do Alasca à Terra do Fogo) e uma da pequena família Polioptilidae (composta por menos de 10 espécies, em geral aves vulgarmente denominadas balança-rabo).

Em termos numéricos, as novas espécies amazônicas representam um acréscimo de quase 1% na biodiversidade nacional de aves. “Somos o segundo país com maior número de espécies de aves conhecidas, cerca de 1.840”, afirma Luís Fábio Silveira, curador do setor de ornitologia do Museu de Zoologia da USP, um dos coordenadores da iniciativa. “Apenas a Colômbia tem mais espécies do que nós, aproximadamente 1.900. Mas, daqui a uma década, devemos chegar às 2 mil espécies de aves conhecidas no Brasil. Há vários exemplares de aves desconhecidas nos museus brasileiros, oriundos de diversos biomas, que serão descritos nos próximos anos.”

As aves são o grupo de vertebrados mais estudado da biologia. No entanto, parece haver muito a ser conhecido, especialmente na Amazônia, ainda que esse bioma tenha sido alvo de muitas pesquisas nas últimas décadas. “A biodiversidade em geral, e mesmo a de aves deste bioma, está longe de ter sido completamente amostrada”, diz o ornitólogo Bret Whitney, pesquisador do Museu de Ciência Natural da Universidade Estadual da Louisiania e principal coordenador da empreitada. “Ainda falta muito para a Amazônia ser considerada suficientemente bem conhecida e, assim, permitir o planejamento e a sustentabilidade das reservas de biodiversidade já existentes e também das futuras.” Em paralelo à vida acadêmica, Whitney é sócio de uma empresa de ecoturismo, a Field Guides, que leva pessoas para observar aves em vários pontos do globo, inclusive da Amazônia.

Nova espécie de arapaçu-de-bico-torto

Algumas das dezenas de expedições feitas pela Amazônia nos últimos 10 anos que levaram à descoberta de novas espécies foram custeadas, parcial ou totalmente, por um projeto de Silveira financiado pela FAPESP. Outras contaram com apoio do CNPq, do Ministério do Meio Ambiente, do Programa de Pesquisa em Biodiversidade do Ministério da Ciência e Tecnologia, de secretarias estaduais e até da americana National Geographic Society. Numa dessas incursões pela floresta tropical, no ano passado, duas dezenas de pesquisadores e alunos de pós-graduação das instituições envolvidas no projeto alugaram durante um mês, por R$ 75 mil, um barco para percorrer o rio Sucunduri, um afluente do Madeira, em busca de novas espécies de aves.

Em outros momentos, os cientistas precisaram até do apoio de proteção armada para entrar em regiões que poderiam abrigar novas formas de aves. A localidade tipo de uma das novas espécies, um arapaçu-de-bico-torto, é a Floresta Nacional de Altamira, próxima à rodovia BR-163, no sul do Pará. A área é uma unidade de conservação do Ibama. “Mas, para podermos trabalhar com segurança na reserva, tivemos de ser escoltados por soldados do Exército brasileiro. Havia um garimpo ilegal em funcionamento na unidade”, conta Aleixo, da seção de ornitologia do MPEG. “A tensão de trabalhar num lugar assim é grande e, não fosse a presença do Exército, não teríamos conseguido.”

Modernamente, o processo de descrição de espécies recém-descobertas ocorre nas páginas de revistas científicas, não mais em livros. Mas a importância e a singularidade do conjunto de novas espécies de aves amazônicas fizeram os editores da enciclopédia e os autores dos trabalhos optarem por um caminho alternativo. Cada nova espécie foi alvo de um paper independente, um artigo científico, nos moldes do que seria preparado para um periódico acadêmico, e a equipe do Handbook contratou os serviços de um grupo de especialistas para atuar no processo de revisão por pares e aprovação dos textos com as descrições formais de cada espécie. Para a ciência, o texto que descreve e batiza com um nome em latim, composto de dois termos (gênero e espécie), uma nova forma de vida equivale ao atestado de nascimento da espécie. Serve também como uma documentação fundamental da biodiversidade de uma região, no caso das aves da Amazônia, e para a formulação de políticas públicas de caráter ambiental.


A iniciativa de publicar todas as novas espécies de uma vez ganhou corpo no ano passado e foi coordenada por Whitney, Silveira, Cohn-Haft e Aleixo, sempre com a participação de alunos de pós-graduação de suas respectivas instituições. O grupo estava produzindo textos para o 17º volume do Handbook, que traria informações de espécies de aves descobertas recentemente em todo o mundo, entre 1992 e 2011. As espécies formalmente descritas pela ciência nesse período haviam ficado de fora dos demais 16 livros da série, que resumiam e organizavam dados de cada membro das famílias conhecidas de aves. Inicialmente, o volume especial da obra trataria de 68 espécies, todas já descritas formalmente empapers publicados em revistas científicas nas últimas duas décadas, o que dá uma média de menos de 4 novas espécies descobertas por ano. No final, o livro extra trará 83 espécies, incluindo as 15 da Amazônia cuja descrição científica ocorre excepcionalmente no próprio livro. Ao optar por revelar simultaneamente as novas espécies numa única obra, a ideia do grupo era chamar a atenção para a importância de preservar a biodiversidade da Amazônia, onde podem ser encontrados dois terços das espécies de aves presentes no Brasil. “Se publicássemos cada paper em separado, em revistas distintas, o impacto não seria o mesmo”, diz Silveira.

O ato de procurar por aves no meio natural remete à imagem de um sujeito de bermudas, camiseta, chapéu e binóculos na mão. Talvez uma máquina fotográfica também componha o cenário. No entanto, um item não mencionado é mais do que obrigatório para os ornitólogos: um gravador. A maioria das 15 novas espécies foi, inicialmente, identificada por seu cantar, que, aos ouvidos dos especialistas, apresentava caráter diferente ou pouco familiar. “Não é preciso ser superdotado para reconhecer um cantar diferente. É questão de treino”, diz Whitney. “É como reconhecer pelo primeiro acorde uma música nova de sua banda favorita.”

Há apenas duas décadas, a descrição de uma nova espécie de ave, como ocorria com a maioria dos seres vivos, se baseava apenas na singularidade de sua anatomia e aparência externa. Se a plumagem e as estruturas ósseas de um exemplar eram diferentes significativamente dos traços encontrados nas espécies conhecidas, esse animal podia ser rotulado como sendo de uma nova espécie. Hoje, além da morfologia, outros dois critérios fundamentais são usados para propor a existência de novas espécie de aves: a análise de suas vocalizações e de seu material genético. “Atualmente há pesquisadores que propõem a existência de uma nova espécie de ave mesmo quando apenas um desses três parâmetros se mostra distinto das demais espécies conhecidas”, afirma Silveira. “Fomos conservadores em nosso trabalho e propusemos uma nova espécie apenas quando encontramos divergências em pelo menos dois desses três critérios.”


Com a ajuda de softwares especializados, o canto gravado de cada candidata a nova espécie de ave foi comparado com vocalizações homólogas de espécies semelhantes. Às vezes, bastaram uns poucos segundos de comparação para confirmar a primeira impressão captada pelo ouvido treinado dos ornitólogos: as frequências sonoras emitidas pelas novas espécies eram distintas dos cantos produzidos por aves aparentadas, mesmo de algumas espécies que lhes eram fisicamente extremamente semelhantes. De cada ave descoberta, os pesquisadores também sequenciaram alguns milhares de pares de bases de genes presentes no DNA nuclear e nas mitocôndrias, organelas celulares responsáveis pela produção de energia que têm genoma próprio, independente, frequentemente usado para estudos de filogenia.

O material genético foi comparado com o DNA de espécies já conhecidas a fim de averiguar sua singularidade e montar, quando possível, relações de parentesco ou uma árvore filogenética da nova espécie. “Para boa parte das novas aves que estamos descrevendo, a confirmação de que se tratava de espécies diferentes foi realmente obtida com a inclusão do aspecto genético nas análises”, comenta Aleixo. “Isso reforça a importância de que a coleta científica de espécimes tem que ser acompanhada pela obtenção de material genético, algo que, infelizmente, ainda não é praticado em vários museus e coleções de todo o Brasil.”

Bico-chato-do-sucunduri

Os estudos genéticos são capazes de revelar informações preciosas sobre as origens das espécies. A história evolutiva de duas novas aves agora descritas, dois chorozinhos do gênero Herpsilochmus, é bem ilustrativa do tipo de contribuição que pode ser obtida com essa abordagem. Ambas as espécies são quase iguais do ponto de vista morfológico, mas suas vocalizações são nitidamente distintas. Uma das aves habita um trecho da margem direita do rio Madeira e outra vive apenas na margem esquerda. Nesse caso, o Madeira, cuja distância entre as margens pode atingir quase 10 quilômetros em alguns pontos, funciona como uma barreira natural entre as duas populações de aves, que não mantêm contato uma com a outra. A separação prolongada dos dois grupos de chorozinhos levou ao processo evolutivo que os biólogos denominam especiação: o surgimento de uma nova espécie, no caso de duas, originadas da fragmentação de uma população ancestral comum e que hoje ocorrem em ambientes sem comunicação (efeito vicariante). Apesar das enormes semelhanças morfológicas entre as duas populações de chorozinhos, os estudos genéticos relevaram – e esse é o dado realmente surpreendente – que elas foram isoladas pelo Madeira 2 milhões de anos atrás.

O papel dos grandes rios da Amazônia, barreiras geográficas intransponíveis para muitas espécies, no surgimento de novas formas de vida é bem conhecido pela ciência. Segundo os ornitólogos, a novidade é que mesmo cursos d’água não tão monumentais podem desempenhar a mesma função em certos casos. Pelo menos três novas espécies foram descobertas, por exemplo, na região que fica entre os rios Aripuanã e Machado, no sul do Amazonas e norte de Rondônia: um dos chorozinhos acima mencionados, a choquinha-do-rio-roosevelt e o cantador-de-rondon (esses são os nomes populares das aves). Essa área, por onde passa também o rio Roosevelt, funcionou como um refúgio para espécies menores de aves, que ficaram “presas” e acabaram, com o passar dos anos, desenvolvendo características próprias no interior do território entre as margens dos cursos d’água. “Alguns rios da Amazônia foram mudando seu percurso ao longo da história evolutiva”, afirma Silveira. “Às vezes, esse processo de acomodação dos leitos de rios promove a separação de populações de aves que antes habitavam o mesmo ambiente.” Os numerosos rios que serpenteiam pela maior floresta tropical são uma caudalosa fonte de biodiversidade, dentro e fora de suas águas.

domingo, 27 de outubro de 2013

A história da Embrapa e da pesquisa agropecuária brasileira - 40 anos




A história da Embrapa e da pesquisa agropecuária brasileira, contada a partir de depoimentos em vídeo, histórias de vida e resgate de fatos marcantes, está disponível em um hotsite - www.embrapa.br/40anos - lançado este ano. O canal reúne seções que revelam fatos e emoções vivenciados por quem ajudou a construir o sucesso da agricultura brasileira.

Uma linha do tempo apresenta destaques da atuação da Embrapa e de seus parceiros nas últimas quatro décadas e alguns marcos tecnológicos de cada período, assim como uma visão de futuro da pesquisa agropecuária. Os usuários têm espaço aberto para comentar e contar as suas próprias histórias. Destaque também para a seção de perfis de personagens, escritos no estilo Jornalismo Literário.

O hotsite Embrapa 40 Anos também traz uma seção com os últimos lançamentos de tecnologias, produtos e serviços da pesquisa agropecuária e uma agenda de eventos que abrange ações realizadas em todo o Brasil. A página ficará no ar até abril de 2014, quando aEmbrapa chegará aos 41 anos, e até lá será constantemente atualizada e ganhará novas seções.

Principais acontecimentos

FONTE
Embrapa

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Chefe da ONU pede mais investimento financeiro para combater mudanças climáticas


Foto: ONU/Mark Garten

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, pediu esta semana à comunidade internacional que intensifique seu investimento financeiro em tecnologias, políticas e práticas que ajudem a combater as mudanças climáticas.

“A mudança climática é a maior ameaça ao desenvolvimento sustentável. No entanto, muitas vezes, um fato importante se perde diante do medo. Enfrentar a mudança climática é uma das nossas maiores oportunidades”, disse Ban na reunião anual do Clube Internacional de Financiamento ao Desenvolvimento (IDFC, na sigla em inglês). “Com ações claras podemos criar empregos, melhorar a saúde pública e proteger o meio ambiente”, acrescentou.


Em discurso, Ban ressaltou o papel que a comunidade de financiamento ao desenvolvimento e o setor financeiro têm na criação de soluções para as mudanças climáticas. Por exemplo, é necessário muito capital para desenvolver infraestruturas de baixo carbono e as empresas verdes precisam de investimentos para fechar a lacuna entre projetos de baixa emissão de carbono e combustível fóssil.

Conforme o impacto econômico das mudanças climáticas cresce, mais precisa ser feito, disse o secretário-geral, pedindo que o IDFC se envolva ativamente na Cúpula do Clima de 2014 – que reunirá chefes de Estado, líderes globais de negócios, finanças e da sociedade civil.

“Nosso objetivo é mobilizar a vontade política para as negociações, oferecer novos compromissos concretos e desencadear uma corrida para o topo em ações climáticas”, explicou Ban. “Espero que vocês usem coletivamente a Cúpula do Clima de 2014 para atingir a meta de 100 bilhões de dólares por ano para novos compromissos de financiamento do clima.”

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Vespas podem substituir agrotóxicos no combate às pragas nas lavouras (c/vídeo)



Uma vespa pode mudar o panorama das lavouras. Apontada pela revista Fast Company como uma das 50 empresas mais inovadoras do mundo, a Bug Agentes Biológicos, de Piracicaba, em São Paulo, oferece uma alternativa sustentável para o combate às pragas. Com a técnica, uma cartela pequena de papelão contendo ovinhos de vespas pode proteger 1 hectare de uma plantação.

Mas essa não é a única solução para o problema: no Brasil, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) realiza diversos estudos para a substituição dos agrotóxicos - envolvendo até a utilização de feromônios sexuais de percevejos marrons como forma de atração de inimigos naturais.

A ideia não é nova. "O Brasil tem o maior programa de controle biológico do mundo", afirma o agrônomo Diogo Rodrigues Carvalho, sócio-diretor da Bug. A inovação da empresa foi transformar um conceito consagrado em pesquisas em um produto comercial. "A microvespa que utilizamos é do gênero Trichogramma, o parasitóide mais estudado no mundo", explica.

Além do Brasil, a Europa também tem tradição nesse tipo de controle de pragas. De acordo com Carvalho, a diferença é que lá as áreas são pequenas, e os cultivos, em estufa. O inverno rigoroso ajuda a quebrar o ciclo de pragas. "No Brasil, nós temos pragas o ano todo, e as áreas são extensas", esclarece.

O ataque das vespas


Tamanho não é documento. Os insetos produzidos pela Bug - que muitas vezes não atingem um milímetro - justificam o jargão e têm se mostrado um método eficaz nas lavouras. Conforme Carvalho, as vespas atacam as principais pragas das grandes culturas, como a cana-de-açúcar e a soja.

As microvespas depositam seus ovos dentros dos ovos da praga, alimentando-se do seu conteúdo interno e impedindo o nascimento da lagarta, responsável pelos principais danos na cultura. Dessa forma, nasce uma outra microvespa que vai controlar outros ovos e se multiplicar na cultura.

Para chegar a esse resultado, a Bug realiza a coleta das vespas, a maioria delas do gênero Trichogramma sp, em diversas culturas. "Sempre coletamos nas regiões em que vamos liberar, ou seja, coletamos o nativo e multiplicamos para o produtor", explica Carvalho. Os produtores recebem a cartela pronta para a liberação das vespas na sua forma de pupa ou crisálida, antes do nascimento do adulto.

Raúl Alberto Laumann, pesquisador do Laboratório de Semioquímicos na Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, explica a importância das vespas e o processo desenvolvido pelo parasita: "Os parasitóides são insetos que vivem como parasitas de artrópodes, geralmente insetos, durante a etapa de desenvolvimento larval ocasionando a morte de seus hospedeiros. São importantes componentes dos ecossistemas terrestres e cumprem uma função fundamental como inimigos naturais de insetos herbívoros.Durante seu ciclo vital os parasitoides passam por uma etapa crucial, que é o momento no qual as fêmeas precisam procurar um novo hospedeiro para parasitar (busca) e, uma vez localizado, decidir se realizam a oviposição ou não (seleção). Este processo é fundamental sob o ponto de vista do controle biológico já que o parasitismo bem sucedido culmina com a morte do hospedeiro e consequentemente tem impacto nos níveis populacionais do inseto alvo do controle".

Os parasitóides utilizados pela Bug têm, como objetivo, substituir os inseticidas e trazer benefícios para o produtor e para o meio ambiente. O bolso do agricultor também sente o peso da mudança. O custo de implantação da técnica varia conforme a praga e a cultura, mas é geralmente menor. "Na maioria das vezes, ele fica de 30 a 40% mais barato do que o químico", esclarece Carvalho.

Mas as vespas não podem ser empregadas em qualquer caso. De acordo com Carvalho, ainda não se pode controlar as pragas de solo, por exemplo. "Nesses casos, portanto, é necessária a intervenção química, que atrapalha os insetos benéficos que foram liberados", argumenta.

Com foco no mercado nacional, a empresa possui cerca de 50 grandes clientes, entre Usinas de cana-de-açúcar, cooperativas e produtores de soja, além de 200 clientes menores, como os produtores de hortifrúti.

Visando a uma agricultura mais saudável, a Embrapa também realiza pesquisas e desenvolve tecnologias de controle biológico. Localizada em Brasília, a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, uma das 47 unidades, investe em trabalhos com semioquímicos, biopesticidas, inseticidas biológicos, entre outros.

As pesquisas na área de ecologia química e comportamento de insetos, realizada pelo Laboratório de Semioquímicos da Embrapa, foram iniciadas no final da década de 80. Conforme Laumann, o trabalho desenvolvido pelo laboratório tem o intuito de estudar a comunicação química entre organismos vivos, intermediada por estímulos (moléculas) químicos conhecidos como semioquímicos. "Estamos particularmente interessados nas interações químicas entre os insetos e entre os insetos e o meio, para aplicação destes estudos no manejo de pragas agrícolas", esclarece.

Entre as pesquisas realizadas, Laumann destaca: Identificação de feromônios de insetos, interações químicas entre insetos e plantas e entre insetos herbivórios e seus inimigos naturais (insetos predadores ou parasitóides). Tudo isso para entender como os insetos se comunicam ou como funcionam processos vitais como migrações, reprodução, procura de alimento, de presas, no caso de insetos predadores, e hospedeiros, para os parasitoides.

Dessa forma, Laumann explica que são realizadas diversas etapas até que a técnica possa ser utilizada para o manejo de pragas. Primeiro, é preciso isolar e identificar as substâncias químicas, analisar quais comportamentos elas modulam e por quais mecanismos elas atuam, para então produzir, de forma artificial, essa subtância (síntese química), avaliar sua eficiência e finalmente viabilizá-la.

Armadilhas com feromônio
De acordo com Laumann, uma técnica que já está em uma etapa bem avançada das pesquisas, e que teve comprovada a sua eficiência, foi o uso de armadilhas iscadas com feromônios sexuais para o monitoramento do percevejo marrom Euschistus heros. Por meio dessa técnica, cuja pesquisa inicial ocorreu na década de 1980, o produtor pode decidir o momento certo de realizar uma medida de controle, diminuindo o custo de produção, além de auxiliar na redução das aplicações de inseticidas.

"Essas pesquisas têm resultado na descrição dos feromônios da maior parte dos percevejos, que são pragas de soja e outros grãos (feijão, milho, girassol, arroz) de grande importância para a agricultura brasileira", justifica Laumann.

Além do monitoramento das pragas, por meio de armadilhas, o uso de feromônios e outros semioquímicos em campo pode ser usado ainda para manipular o comportamento de seus inimigos naturais. Segundo Laumann, dessa forma os inimigos naturais são atraídos para determinados locais, onde matam os insetos praga, diminuindo suas populações e, consequentemente, o dano que eles causam nas áreas cultivadas.

Para o pesquisador Miguel Borges, que trabalha na mesma unidade, o mercado de semioquímicos está crescendo e ocupa hoje em torno de 30% do mercado de biopesticidas no mundo, perdendo apenas para os inseticidas bacterianos e botânicos.

Biopesticidas

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Outro trabalho realizado pela Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia na área de controle biológico de pragas é conhecido como controle microbiano. De acordo com o pesquisador Rogério Biaggioni Lopes, as pesquisas datam do início da década de 1980 e consistem no desenvolvimento de produtos à base de microrganismos patogênicos a insetos que já existem na natureza, chamados biopesticidas.

Dessa forma, o controle microbiano busca reduzir a população de uma praga em determinado cultivo, de maneira a não causar prejuízos ao agricultor. Comparado com o agrotóxico, o biopesticida é específico, pois combate uma ou apenas algumas poucas pragas, o que resulta, segundo Lopes, em um baixíssimo impacto na população de outros organismos no campo, além de não causar desequilíbrios no sistema produtivo.

Lopes apresenta ainda outra vantagem do produto: "Biopesticidas registrados e usados da forma correta são também bem mais seguros para quem manipula o insumo e não deixam resíduos nos produtos agrícolas por degradarem-se rapidamente, além de não serem tóxicos para outros animais e o homem". Se por um lado a técnica apresenta vantagens, por outro há uma limitação da gama de alvos que um biopesticida pode atingir, dependendo da espécie do microrganismo.

Para Lopes, no entanto, qualquer inseto pode ser combatido com o uso de biopesticidas desde que eles sejam desenvolvidos para o alvo desejado. "A natureza é rica em diversidade de espécies e raças de microrganismos que podem ser explorados. Basta identificar quais dessas tem potencial para cada alvo", argumenta. E esse é o trabalho que a Embrapa vem realizando. De acordo com o pesquisador, o desenvolvimento de biopesticida passa por várias etapas, que vão desde o isolamento e manutenção desses microrganismos em bancos de germoplasma até etapas industriais de produção massal e formulação.

Já a aplicação depende das características da formulação e dos hábitos da praga-alvo. Entretanto, Lopes esclarece que, na maioria dos casos, a aplicação é feita por meio de pulverização ou polvilhamento, utilizando os mesmos tipos de equipamentos de outros produtos fitossanitários, tornando o custo operacional semelhante ao dos demais produtos.

O mercado de biopesticidas é muito dinâmico e ainda está em fase de crescimento, o que inviabiliza dados concretos sobre a útilização da técnica por parte dos produtores. "Apesar de a produção em agricultura orgânica de alimentos ser pequena se comparada aos cultivos convencionais, boa parte dos agricultores orgânicos empregam biopesticidas em suas culturas. Mas certamente o maior volume de biopesticidas é comercializado para cultivos convencionais", justifica.

Segundo o pesquisador, levantamentos feitos recentemente mostram que cerca de 600 mil hectares de cana-de-açúcar são tratados anualmente com um fungo para o controle de uma praga da cultura. Além disso, em milhares de hectares, são também utilizados bactérias e vírus para o controle de lagartas em certas culturas. "Muito do que se faz pelos pesquisadores que trabalham nessa área em todo o país é novo. Ainda faltam pesquisas em diversas etapas do desenvolvimento de biopesticidas", finaliza Lopes.

Há muito estudo pela frente para disseminar ainda mais o controle biológico. Mas iniciativas como a da Bug podem acelerar um processo louvável: reduzir o uso de agrotóxicos nas lavouras do Brasil em busca de uma agricultura mais saudável.

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